quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Uma cena.

Ela tava doente, sabia disso e não disse nada pra ninguém. Quando eu soube, pensei que nunca a perdoaria por manter esse segredo. Mas percebi que nunca me perdoaria por não ter notado.


- Oi, amiga, que coisa, né... eu tava fazendo o tratamento direitinho...

- Não se esforça. Mas isso é coisa que se faça? Dar esse susto em todo mundo, tão todos aí fora pra te ver...

- Eu não quero ver ninguém, antes de falar com você. Você já sabe da novidade? A Ju tá namorando seu filho...

- Sei...

- Achei que você fosse ficar preocupada.

- Já marquei o analista pra ele, daqui há alguns meses, rs.

- A Ju não puxou a mãe.

- Puxou a amiga.

- Mercedes, se acontecer alguma coisa comigo, você vai cuidar da Ju e não vai abandonar o Carlos...

- Para com isso, que bobagem.

- Eu paro, mas só se você me prometer.

- Você tá falando bobagem, eu vou brigar com você...

- Promete, Mercedes...

- Como você é chata, rs. Prometo.

- E promete que você não vai chorar também.

- Quem tá chorando?

- Você. Não chora.

- Não vou chorar...

- Então pega minha bolsinha de maquiagem, tá ali, ó, em cima da mesa, me arruma um pouquinho? O Carlos Ernesto nunca me viu sem rímel, ele vai se assustar. O câncer é uma doença que deixa a gente nada apresentável.

- Você tá exagerando, viu, amiga. Sabe o que parece? Que você não dormiu direito, só isso...

- Eu tou muito feita, muito feia... Pega um batom clarinho, é mais apropriado pra ocasião. O cabelo eu acho melhor prender. Eu nem tive tempo de retocar a raíz... e o blush... é, esse, é o alaranjado, que tá acabando. A sombra é nova, as cores são lindas... Mercedes, você escolhe a cor que você quiser...

- Agora quieta, tá? Cê tem que descansar. Nossa, mas a sombra é linda mesmo. Chanel, né? rs. Coisa fina. Sabe o que eu tava pensando...

- Hum...

- Um dia desses... fecha os olhinhos, fecha, aproveita e descansa. Então, um dia desses a gente bem que podia fazer uma viagem daquelas, aquelas viagens que a gente fazia pra Búzios, lembra como a gente se divertia?

- hum rum...

- Só nos duas, hã? O Carlos Ernesto fica com a Ju, o Gustavo fica com os filhos, vai ser bom, vai ser muito bom. Outra coisa que eu tou precisando fazer com urgência é comprar roupa, nossa, sem você eu não sei fazer essas coisas, não... Essa sombra é linda mesmo. Abre os olhos, Mônica, eu vou esfumaçar embaixo...

(...)

- Abre os olhos, Mônica...


Era um câncer raro. Morrer rápido, pra mim, Lopes, é uma vitória. Atingir a meta oficial sem prorrogação. Falei tanto na Mônica aqui nesse consultório... mas eu falei no presente. Vai ser muito difícil falar dela no passado. Eu tou com tanta saudade... sabe do que eu sinto falta? Da amizade dela... a Mônica foi tão feliz, com quem ela quis, como ela quis... e me fez feliz. Então eu penso assim, onde quer que ela esteja, se ela tiver bem, em paz, eu não tenho alternativa. Eu tenho que ficar bem também. Não é assim?


(Divã - O Filme)

4 comentários:

Jeferson Cardoso disse...

Poxa, Roberto, eu revivi o filme. Muito bacana isso. Uma experiência bem legal. Parabéns pela postagem! Abraço!

“Para o legítimo sonhador não há sonho frustrado, mas sim sonho em curso” (Jefhcardoso)

Gostaria de lhe convidar para que comentasse o meu “A Cruel Vingança De Seu Ignácio”. Ok?
http://jefhcardoso.blogspot.com de blog em blog.

Taíssa Claro - disse...

nossa eu vi esse filme
e essa cena foi muito marcante..
to seguindo

Marina ;* disse...

Gostei muito daqui. É bem legal ver um homem escrevendo algo que preste.
estou te seguindo
Beijo

bruniuhhh disse...

ótima cena *-*